Diálogo com a vida


Estava eu em algum lugar quando a minha vida me disse:
"Poxa, sou toda tua e você não me namora? Sou teu templo,
o teu espaço de infinitas possibilidades no universo.
Me leve para passear, me faça sorrir, quero flores!"
Foi então que olhei para dentro de mim e disse a ela:
"Mê de tuas mãos e vamos então, pois sei que você, Vida,
depende de mim para viver feliz!"

NADA VENCE A NOSSA CHAMA




Minhas pernas tremem quando cruzam ao longe,
Vejo a tua imagem, ao horizonte, que me espreita com olhos de gueixa,
Estico meus braços, busco te alcançar, saio em teu encalço...
Sigo teus passos, teu perfume me deixa pistas, deixa-me rastros!
Teu cheiro me deleita e me faz se sentir em algum paraíso, em meu éden.
Teu vestido me enlaça em mil fantasias, entre anjos e flores...
Até a noite, até a lua, até as estrelas se espantam com a cena,
Nos invejam como o anjo desertado invejou a tríade!
Teu corpo explora todo meu doce pudor, o universo se enche de rubor!
E meu gozo de êxtase vem do fundo da alma...mil lobos uivam em mim,
E a lua e as estrelas transam sob a luz de nossa fogueira!
E o céu então todo se derrama, mas nada vence a nossa chama!

BARULHO DE MOBILETES


Era nos domingos de verão, toda a turma na praça, as meninas desfilavam,

A gente ouvia música, a gente jogava xadrez e o padre alemão nos olhava.

Um rap tocava, era mano racional que protestava, o skate descia a escada,

E uma bola de vôlei voava...voava...caia na fonte...era água...era luz a sorrir.

Camisão aberto, cabeça rapada, desprovido de qualquer maior preocupação,

Eu imaginava nunca crescer, eu me via sempre ali, na praça, na molecada,

Contando minhas histórias, jogando conversa fora, fugindo da mera moda,

Uma rebeldia sem causa, um jovem que eu fora outrora, no verso e na prosa!

Ainda ouço o barulho das mobiletes, saudade imensa do meu fusca vermelho:

E quando passo pela paineira de copa alta me arrepio ao fundo...então choro.

Sento sobre as suas raízes que fortemente venceram o concreto da calçada,

Eles estão ali sentados comigo: são os meus amigos que já se transcenderam,

Que num estalar de dedos foram-se embora, romperam o mar, a doce aurora!

UMA INDAGAÇÃO


Parto esta noite, arrumo as malas, sem destino...

Leio Gênesis e o verbo me rasga todo e sangra,

Onde estará a prometida divindade reflexa em mim?

Labor...temores...o tempo, só agora percebo

Que o tempo, desconcertante, me persegue pelo caminho,

Como sombra a me encurralar entre o sol e o chegar da lua.

Não importa, pois, o destino, o caminho será sempre o mesmo,

É por isso que parto, logo após o parto que passei no quarto.

Eu pari um revolta, uma volta aos pilares da fé, uma indagação:

Se fomos feito à imagem e semelhança de Deus, o que é o inverso?

Se Deus se fez homem, quero agora me fazer-se de Deus,

O universo, em tom grave, diz que posso, embora seja loucura maior!

Que o mundo da fantasia retorne, que mares se abram, que anjos surjam,

Que a terra prometida se regularize, que os fiéis se amem...

Buda, Jesus, Maomé, todos os batizo como irmãos,

Que caia a Babel da última e única verdade, multifacetados somos!

Eu existirei no perdão e no abraço de um palestino a um israelense,

Na faixa de Gaza, na construção conjunta de casas populares.

Será que você volta?


O vento sopra forte lá fora,

Janelas se abrem em mim,

Descortina-se meu passado,

E a tenaz tristeza me envolve.


Encosto-me à parede da sala,

Debruço-me, estou a soluçar,

Tua ausência se faz presente,

O vento me cinge de saudade.


E por que você me deixou só

Naquela doce tarde de verão?

Os Meus olhos se enchem todo,

Lágrimas caem e marcam o chão.


Será que um dia você irá voltar?

Será que novamente irá me amar?

O vento está agitado, tudo arrasta,

Mas só com teu beijo a tristeza passa!

AMOR IMERSO

Vejo meus olhos espiando a profundidade de meu ser Sinto meu corpo escorregando nos desfiladeiros de minha alma. E mesmo assim não perco...